Evento de parque estadual em unidade de conservação e próximo a zoológico usa fogos de artifício e gera críticas: 'Poluição sonora e luminosa', diz biólogo
04/11/2025
(Foto: Reprodução) Evento com fogos de artifício dentro de unidade de conservação é alvo de críticas
Um evento de Halloween promovido pelo Parque Estadual de Dois Irmãos, na Zona Norte do Recife, virou alvo de críticas de biólogos. Com uso de fogos de artifício, música alta e gritaria do público (veja vídeo acima), o "Parque dos condenados" foi realizado numa unidade de conservação ambiental protegida por lei, numa área de mata atlântica onde também funciona o zoológico da cidade.
No estado, desde 2016 há uma lei que proíbe a queima de fogos em unidades de conservação e a menos de dois quilômetros de zoológicos e outros ambientes específicos.
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Com a proposta de "sons, gritos, fogo e tensão sensorial", a atração aconteceu nas noites de 24, 25, 30 e 31 de outubro. A procura pelo evento temático foi grande e os ingressos esgotaram para as quatro sessões.
Diversos influenciadores digitais foram convidados para a atração e os registros das noites repercutiram nas redes sociais. Em alguns dos vídeos publicados por eles, é possível ver os fogos e ouvir a gritaria das pessoas ao correr de "monstros". O caso foi publicado inicialmente pelo portal Marco Zero Conteúdo.
Fotos e vídeos do evento foram publicados no Instagram oficial do parque e, nos comentários, as publicações enfrentaram diversas críticas de internautas e até mesmo de membros do Conselho Gestor do local, que disseram não ter sido consultados para a realização do evento.
A publicação que continha críticas nos comentários foi posteriormente excluída do perfil do Parque Estadual de Dois Irmãos.
A lei e as críticas
Fogos de artifício sem estampidos foram usados à noite dentro do Parque Dois Irmãos
Montagem/g1
O parque tem 1.158 hectares de área e é considerado um importante centro de conservação da natureza do país. O local abriga fragmento de mata atlântica, com os açudes do Prata, do Meio e o de Dois Irmãos, e 14 hectares de área construída do zoológico.
De acordo com lei estadual 15.736, são proibidas "a queima e a soltura de fogos de artifício e assemelhados, e de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso com ou sem estampidos" próximo a manguezais e zoológicos, devendo ser respeitada a distância mínima de dois quilômetros destes ambientes.
A legislação também prevê a proibição de fogos de artifício em unidades de conservação de proteção integral. Além das poluições sonora e luminosa, o uso de fogo em uma ambiente arborizado e com gramado também é um risco para incêndio.
Para Filipe Aléssio, doutor em Biociências e membro do Conselho Gestor do Parque Estadual Dois Irmãos, eventos de educação ambiental são bem-vindos, mas devem se adaptar à realidade do espaço.
"Não é problema nenhum ter um um projeto de educação ambiental, de visita noturna no zoológico, mas seguindo todos os protocolos de bem-estar animal. (...) Nesse formato de susto, de gritaria, de fogos, não pode, de música alta, não pode. Não cabe no zoológico, não cabe num ambiente de conservação da natureza", disse ao g1.
Segundo o pesquisador, a fauna do local pode sofrer com a iluminação excessiva e também com o barulho.
"Não é natural ter tanta luz e som alto no ambiente natural. Tem estudos que mostram o efeito da poluição sonora e poluição luminosa. (...) Afeta as comunidades de morcegos, por exemplo, ou de aves mesmo, que mudam o comportamento", comentou.
Segundo ele, mesmo que os fogos sejam disparados longe dos recintos dos animais do zoológico, ainda há uma fauna que tem vida livre pela mata. Entre as espécies que frequentam a área estão capivaras, macacos, preguiças e quatis. São animais que, em sua maioria, têm hábitos diurnos.
"Existem animais que são selvagens e vivem fora do dos recintos, são de vida livre, como as capivaras, como pequenos mamíferos que têm hábito diurno, com o sagui que estaria dormindo nesse horário dessas atividades noturnas. Além de todas as espécies de aves que, em sua grande maioria, são têm hábitos diurnos e estariam dormindo", explicou Aléssio.
O que diz o Parque Dois Irmãos
Procurada pelo g1, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade, que administra o Parque Estadual Dois Irmãos, disse que o evento é "tradicional e de sucesso", acontece há mais de uma década e nunca foi apreciado pelo Conselho Gestor, "já que inexiste previsão legal para tanto".
Em nota, a gestão afirmou que:
"promove todas as suas atividades com foco em educação ambiental e tem plena ciência das restrições legais e de bem-estar animal";
"os artefatos utilizados foram todos sem estampidos, em momento específico e em uma área sem a presença de animais, sem risco de incêndios e com a presença de bombeiros no local do evento";
"o Conselho Gestor do Parque Estadual Dois Irmãos tem caráter consultivo e participativo (...) mas não substituem e nem limitam a autoridade administrativa da unidade de conservação";
que "reafirma seu compromisso com a conservação, o bem-estar animal e o desenvolvimento de atividades de educação ambiental para a população".
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